segunda-feira, maio 08, 2006

boa semana

deixo-vos um poema do grande AL BERTO, poeta que como ninguem conta a vida com as suas dores, com a sua essencia, com a sua insustentavel leveza...
escolhi este poema porque hoje me sinto a remendar o pano das minhas velas... como se também eu estivesse à espera do regresso da luz.



Há-de flutuar uma cidade


Há-de flutuar uma cidade no crepúsculo da vida
pensava eu... como seriam felizes as mulheres
à beira mar debruçadas para a luz caiada
remendando o pano das velas espiando o mar
e a longitude do amor embarcado

por vezes
uma gaivota pousava nas águas
outras era o sol que cegava
e um dardo de sangue alastrava pelo linho da noite
os dias lentíssimos... sem ninguém

e nunca me disseram o nome daquele oceano
esperei sentada à porta... dantes escrevia cartas
punha-me a olhar a risca de mar ao fundo da rua
assim envelheci... acreditando que algum homem ao passar
com a minha solidão

(anos mais tarde, recordo agora, cresceu-me uma pérola no
coração. mas estou só, muito só, não tenho a quem a deixar.)


um dia houve
que nunca mais avistei cidades crepusculares
e os barcos deixaram de fazer escala à minha porta
inclino-me de novo para o pano deste século
recomeço a bordar ou a dormir
tanto faz
sempre tive dúvidas que alguma vez me visite a felicidade


Al berto

4 comentários:

Anónimo disse...

"quantos desejos ficaram abandonados na escuridão intacata dos quartos?
a qual dos demonios me vender?
[...]
que fogo estranho é esse? que devora a beleza interior das coisas...que mentira me poderá salvar?"
Al Berto
dream*

milhafre disse...

bela citação carolina... continua a vir cá quando quiseres.
convido-te a visitar o blog no futuro.

Anónimo disse...

Al Berto... gosto muito. Boa escolha. E já que estamos em maré de citações deixo aqui uma dele, de que gosto muito e q, acho que tem qq coisa a ver contigo. Beijos

"Um dia li num livro:«Viajar cura a melancolia». Creio que, na altura, acreditei no que lia.
(...) Viajar, se não cura a melancolia, pelo menos purifica. Afasta o espirito do que é supérfluo e inútil; e o corpo reencontra a harmonia perdida - entre o homem e a terra. O viajante aprendeu, assim, a cantar a terra, a noite e a luz (...) Aprendeu a nomear o mundo.
Separou com uma linha de água o que nele havia de sedentário daquilo que era nómada; sabe que o homem não foi feito para ficar quieto. A sedentarização empobrece-o, seca-lhe o sangue, mata-lhe a alma - estagna o pensamento.
Por tudo isto, o viajante escolheu o lado nómada da linha de água. Vive ali, e canta - sabendo que a sua vida não terá sido um abismo, se conseguir que o seu canto, ou estilhaços dele, o una de novo ao Universo."

Al Berto

milhafre disse...

Rita obrigado pelo teu comentário e pela citação. Tu e eu sabemos do meu lado nómada,da minha busca. Quando não viajo fisicamente faço-o no universo das palavras feitas sonhos, nesta inconstância de querer viver a vida toda ela sem correntes.. nesta cruzada que as vezes acaba por ser demasiado solitária para ser suportável.

beijo meigo