sexta-feira, fevereiro 24, 2006

o porque de não te escrever um poema

o texto que se segue já é um bocadinho antigo mas continua tão actual como a vontade que tenho de te abraçar.




Quero escrever-te um poema...
Como posso eu escrever-te um poema.???
Como posso eu dizer-te o que me vai na alma ?
Descodificar-te o sonho?
Torna-lo tão real que nem a ode critica dos tempos o poderá sublimar .
Se ao menos pudesse esculpir o meu sonho na areia de uma praia!!!
Mas não... é impossível esculpir o sonho. Dar-lhe materialidade .
O sonho há muito que transcendeu os corpos e se sublimou num murmúrio, sem gestos, sem palavras. Porque as palavras são a mera sublimação dos sonhos que sonhamos.
Ainda assim se procurasse esculpir o meu sonho na areia por certo o mar iria rebelar-se fazendo sucumbir as formas e os contornos, desgastando os enredos como se um sinal divino insistisse em lembrar-me que é demasiado ousado retractar algo tão belo, tão doce.
Talvez esse mesmo deus, seja o deus que impede os artistas de pintar o pôr-do-sol ou aos poetas de alcançarem a verdadeira definição de amor.
No entanto essas interdições são verdadeiramente mais democráticas que a que me impede de escrever-te sobre o meu sonho pois o pôr-do-sol acontece para todos. Podes beijá-lo de lábios cerrados.... ele nunca se irá embora, nunca te irá deixar só. Quanto ao amor, talvez a impossibilidade de definir o amor seja uma dádiva, mais do que um interdito ou proibição.
Afinal a definição dos sentimentos esgota-os tornando-os na sua própria “imagem” e a imagem do sentimento não possui a essência que lhe pretendemos transmitir.
Acredito nisso, embora possa estar errado.
No fundo é também isso que me impede de dar voz ao meu sonho.
Dói-me pensar que não consigo dizer “ ... “ .
Dói-me não conseguir vomitar todas as palavras que permanecem remordidas nos meus lábios e me encantam, porque as sinto, mas que me corroem o coração por não saber dar-lhes corpo e voz.
Sinto-me egoísta por te privar do meu sonho. Embora talvez o faça para te proteger das minhas dores.
Assim poderás ser sempre luz e não sentirás vontade de penetrar no reino das minhas sombras. E eu poderei sofrer sozinho sem receio de aprisionar-te .
Pediste-me um poema...
Como posso eu escrever-te um poema..??..
Como posso descrever-te???
Que palavras irão caracterizar o teu sorriso terno e aconchegante???
Como irei retractar o teu olhar imenso e profundo, verdadeira expressão dessa capacidade de abraçar o mundo??
Não consigo. Acredita.
Se ainda assim pudesse pintar o teu retrato com aguarelas mágicas provenientes do seio da mãe terra. Talvez pudesse colorir o teu olhar com as gotas ténues do orvalho matinal, tombadas sobre a quietude dos cálidos regatos. Isso talvez retractasse a beleza do teu olhar, mas a sua profundidade e dimensão só seria retractada pela magnitude do oceano.
E conjugar de uma forma harmónica uma gota de orvalho de um regato com todo um mar é algo de tão verdadeiramente irrealizável que se compara ao desejo de sorver o mar inteiro de uma golfada.
Quanto ao teu sorriso!!! Só conseguiria retracta-lo se roubasse um pedaço á lua cheia. Pois só a lua têm o mesmo impacto que o teu sorriso exerce sobre mim. Só ela é verdadeiramente luminosa e magnética .
E mesmo ela, por mais que brilhe para todos, esta sujeita ás contrariedades deste mundo em que vivemos. O teu sorriso esse irá manter-se sempre aceso, só espero que as contrariedades da vida não apaguem também a sua luz, isso seria letal para mim, mais do que perder-me a mim próprio, pois iria significar a impossibilidade de encontrar-me.
Pediste-me um poema...
Como posso eu descrever a energia que libertas quando danças, como posso revelar-te a achese perfeita de harmonia que inspiras quando te moves, cada gesto altivo mas humilde que descreves?
Poderia fotografar o voo dos flamingos ao pôr-do-sol, num cenário africano proveniente dos veios da terra vermelha. Talvez pudesse tentá-lo embora não o tenha visualizado pessoalmente pois em tenra idade me tornei “apátrida”.
Deste modo a minha visualização do pôr-do-sol é a simples memória que tenho das descrições feitas pelo meu avó, quando me falava da saudade que tinha dos espaços abertos e das suas caçadas.
Se te deixar de ver, no palco ou na vida, irei sentir uma saudade imensa de ti, tal como ele tinha de África. Uma saudade tão grande que não saberei descrever nem colmatar pois não sei descrever a saudade que tenho de ti, se nem sequer sei falar-te da vontade que tenho de te abraçar, se nem sequer sei exprimir a importância que o facto de ouvir a tua voz desempenha nos meus dias.
Pediste-me um poema ....
Como posso eu escrever-te um poema???
Como posso eu escrever algo de vivo ?
Já escrevi muito, já me dei muito... Mas nunca renasci na presença aconchegante de alguém como tu.
Nunca me vi no espelho de um olhar que reflicta um sorriso tão terno e delicioso como o teu.
Juro-te.... nunca conseguiria dar ás palavras a eloquência e a transcendência que mereces. Todas elas já foram desgastadas e enclausuradas na masmorra das minhas dores e eu assistiria impotente a sua morte, não fosse o facto de te ter conhecido e de me teres emprestado o teu sorrir.
Agora todas elas estão ainda fracas e moribundas e permanecem escondidas nas reentrâncias que tenho nos lábios com medo que te afastes ao ouvi-las, pois todas elas parecem demasiado obsoletas para descrever o que sinto por ti.
Como posso escrever-te um poema??
Demonstrar que te quero muito???
Como posso revelar-te o brilho que a tua presença vai devolvendo ao meu olhar.
Será que sabes como faze-lo???
Sinto-me inerte, é tudo demasiado colossal.
Tão colossal como a vontade que tenho de te dizer tudo, como o medo que tenho de te magoar e de te perder.
Talvez tu entendas as palavras que não digo, talvez tu possuas o olhar que te leva a ver para além do visível como se te permitisses a oscultar-me a alma e sorver-me o que não sei dizer.
Assim talvez entendas o meu silêncio e por mais que a dor do que não sei dizer me afogue a alma essa réstia de mim estará verdadeiramente mais segura e viva no aconchego do teu coração . Pelo que poderei descansar reconfortado no alento do teu sorriso amigo.
Começará assim o sonho e findar-se-á a escuridão.
Mas sobretudo saberás que estarei sempre por perto, como e quando o quiseres. E se quiseres poderás encostar a tua cabeça no meu ombro e falar-me das tuas dores, desabafar comigo todos os sonhos. Eu estarei sempre aqui. Mesmo se me for, mesmo se me findar.

5 comentários:

sabine disse...

Quem é a sortuda?

milhafre disse...

não se trata de existir sortuda ou não trata-se apenas da necessidade de gritar

Anónimo disse...

Tão bonito!!
Mais que um poema, mais profundo, mais verdadeiro e cada vez mais teu! Escreves muito bem, preenches qualquer vazio de voz pela tua letra! Pena é a inspiração vir sempre duma amargura...pena a arte ser sempre o fruto venenoso da dor.
beijinhos e desejo que o amor um dia bata à tua porta da mesma forma que bate no teu coração!

Bárbara Alves de Campos disse...

"Cada bloguista participante tem de enumerar cinco manias suas, hábitos muito pessoais que os diferenciem do comum dos mortais. E além de dar ao público conhecimento dessas particularidades, tem de escolher cinco outros bloguistas para entrarem, igualmente, no jogo, não se esquecendo de deixar nos respectivos blogues aviso do "recrutamento". Além disso, cada participante deve reproduzir este "regulamento" no seu blogue."

Anónimo disse...

Adorei o seu poema, o achei por acaso ... Que indpiração !!!

Parabéns ...